sábado, 3 de janeiro de 2015

Inveja



Inspirada em "Você Pra Sempre" de Sandy e Júnior



    Acordei com o som alto do despertador, abri os olhos em relutância e vi que o relógio marcava sete horas, como sempre. Me levantei ainda cambaleando por causa do sono e também pelo fato de ter ficado acordada ontem até tarde, assistindo TV e bebendo um vinho que encontrei esquecido no fundo do armário. Fui até o banheiro, fiz minha higiene e tomei um banho rápido. Me troquei e sai de casa sem tomar café, afinal de contas eu ainda poderia ir até a lanchonete perto do trabalho, onde ele costuma frequentar.

    Entrei em meu carro e fui em direção a lanchonete, chegando lá, me sentei na mesa de sempre. Eu gostava de me sentar no canto, onde eu podia observá-lo melhor sem que ninguém percebesse. Estava tranquila tomando meu café, quando ele apareceu, e, para minha total decepção, ela o estava acompanhando. Nunca entendi o que ele viu naquela mulher, afinal de contas, como ele nunca pode notar que eu realmente me importo com ele? Trabalhamos juntos, tento conversar com ele sempre que posso, ou, pelo menos, quando meu medo idiota não me impede.

    Às vezes me imagino ali, sentada ao lado dele, no lugar daquela mulher. Às vezes me imagino trocando tantos beijos e abraços com ele quanto ela, talvez até mais. Mas, eu tenho que confessar, mesmo que contra minha vontade, que tenho ciúme daquela mulher, mesmo que ele não me pertença. Eu queria tanto poder tocá-lo, abraçá-lo, beijá-lo e dizer a ele tudo o que sinto e que às vezes acho que não poderei mais esconder. Terminei meu café, sai da lanchonete e fui em direção ao escritório. Ele chegou uns quinze minutos depois de mim.

    -Oi Ellen. - Ele me cumprimentou com um sorriso, apenas retribui. - Como vai?

    -Bem e você? - Perguntei simplesmente.

    -Ótimo. - Como eu adorava aquele sorriso.

    -E sua namorada? - Não sei por que tinha necessidade de saber dela.

    -Vai bem. Vou levá-la para jantar hoje. - Ele se sentou na cadeira em frente a minha mesa. - Fazemos três anos hoje.

    -Que bom. - Respondi simplesmente, acho que o sorriso que tentei esboçar naquele momento deve ter sido o mais falso de toda a minha vida.

    -Bom, eu tenho que ir. Até mais. - Ele se levantou e acenou, apenas acenei de volta.

    Fiquei o observando por um tempo, a luz do sol que entrava pela grande janela do escritório realçava ainda mais a beleza dele, principalmente aqueles olhos claros que ele tinha. Às vezes eu queria ser o sol, queria poder aquecê-lo e confortá-lo. Quando sai do trabalho, antes de ir até meu carro, eu o vi com ela. Eles trocavam caricias e sorriam, tudo parecia perfeito para eles. Por que não podia ser perfeito para mim?

    No dia seguinte esbarrei com ele na entrada da empresa, não pude evitar de encarar os olhos dele enquanto me desculpava.

    -Bom dia. - Ele disse, me despertando de meus devaneios.

    -Bom dia. - Respondi, desviando o olhar e depois voltando a encará-lo. - Então... como foi o jantar ontem? - Por que eu estava perguntando isso?

    -Ótimo. - E de novo aquele sorriso que me enlouquecia. - Eu a pedi em casamento.

    Senti minha respiração falhar, meu coração dando batidas descompassadas e meus olhos se arregalaram em estado de surpresa e choque.

    -Nossa. - Foi a única coisa que saiu da minha boca quando percebi que ele reparou no meu estado, mas logo depois me recompus. - E ela aceitou? - Perguntei séria.

    -Sim. - Acho que nunca o vi sorrir dessa maneira.

    -Nossa... - Minha voz estava falha, eu precisava sair dali antes que enlouquecesse. - Isso é... ótimo. - E mais uma vez, aquele sorriso falso que tomava conta da minha face toda vez que o assunto era o "belo relacionamento" que ele tinha. - Eu tenho que trabalhar. Até mais. - Disse breve e dei as costas.

    Devo ter ficado uns dez minutos chorando no banheiro do escritório e mais umas duas horas em casa naquele dia. Como isso podia estar acontecendo? Eu o amava. Por que ele não podia ver isso?

    Os dias se passaram arrastados, eu seguia minha rotina fingindo que nada daquilo me afetava, mas no fundo, meu coração estava dilacerado. Eu parei de frequentar a lanchonete perto do trabalho, não queria correr o risco de encontrá-los e assistir enquantos eles sorriam vendo catálogos de decorações de casamento. Evitava olhá-lo na saída do trabalho, pois eu sabia que ela estaria lá. E tentava com todas as forças ignorar ele falando com ela no telefone do escritório, as conversas de agora me irritavam mais ainda.

    Pode parecer loucura, mas eu o amava demais. Era difícil para mim ouvir os comentários no escritório sobre a droga do casamento. Eu havia sido convidada, mas nem em meus momentos mais insanos eu pensaria em ir. Quando eu o ouvia falar com as outras pessoas sobre sua noiva, meu coração se apertava ainda mais. Eu queria estar nos pensamentos dele da mesma forma que ela estava. Queria que ele me olhasse da mesma forma que olhava para ela. Queria invadir os sonhos dele e me declarar abertamente.

    Por que ele não podia enxergar o meu amor? O que ele via nela que não havia em mim? A única diferença que eu via entre nós duas era que ela podia tê-lo, podia amá-lo.

    Parecia inacreditável, mas o meses se passaram mais rápido do que eu esperava. O grande dia havia chegado. Seria muito fácil dizer que aquele era um dia comum e que não me afetava em nada, mas eu estaria mentindo. Enquanto aquele era o dia mais especial e feliz na vida dos noivos, o dia que eles celebrariam seu o amor, o dia que se lembrariam para sempre, para mim também seria um dia memorável, o dia em que eu estaria perdendo o amor da minha vida para sempre.

    Não sei o que deu em mim naquele dia, mas, eu peguei meu carro e fui até a igreja. Fiquei parada em uma esquina. Seria muito fácil, e bom, dizer que eu entrei lá e declarei meu amor abertamente para todo mundo ouvir. Seria perversamente bom dizer que eu entrei lá e interrompi aquela cerimônia. Mas não foi nada disso que aconteceu, eu não conseguiria fazer uma coisa dessas. Queria que ele fosse feliz, embora desejasse que essa felicidade fosse alcançada do meu lado e não do dela. Amá-lo em silêncio era a única coisa que me restava, afinal era o que eu vinha fazendo há muito tempo.

    O vidro do meu carro estava aberto, então pude sentir o vento bater no meu rosto. Naquele momento eu pensei que queria ser o vento para poder tocá-lo e envolvê-lo em mim, e poder sussurrar em seu ouvido meus sentimentos.

    Olhei pelo retrovisor e vi todos saindo da igreja felizes, os noivos entraram em uma limusine e foram embora. O carro passou ao lado do meu, não me preocupei em cobrir o rosto, afinal, duvido que eles poderiam me notar.

    Acho que o que me resta agora é me conformar. Minha imaginação seria o único lugar onde eu poderia envolvê-lo em meus braços, sentir o gosto dos seus lábios e amá-lo com todas as minhas forças. Em breve ele não seria nada além de uma memória, uma antiga paixão. Eu tinha inveja do sol que podia aquecê-lo e confortá-lo. Eu tinha inveja do vento que podia tocá-lo e envolvê-lo. Eu tinha tanta inveja daquela mulher e de qualquer pessoa que pudesse tê-lo que não fosse eu. Eu tinha inveja e ciúme de qualquer um que pudesse amá-lo.

Autor: Ana Caroline Recalde (eu mesma)
         Inveja (Wattpad)



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